A Carregar...
Imagem

Visão: "Há milhares de empregos em Portugal para imigrantes ucranianos - garantem as empresas"

A braços com uma desesperante falta de mão de obra, as empresas portuguesas vêm uma oportunidade na vaga de ucranianos que pode chegar em breve a Portugal. Construção civil, têxtil ou calçado são setores que podem absorver “uns milhares”

Preferia que não colmatássemos a falta de mão-de-obra com a tragédia alheia. Mas se pudermos ajudar e ao mesmo tempo resolver um problema…”. Esta é a frase com que o presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal, Mário Jorge Machado, resume a situação que estamos a viver e em que ambos os lados podem sair a ganhar. “Num setor que emprega cerca de 140 mil trabalhadores, contratar 4 ou 5 mil não tem nada de extraordinário”, diz à Visão e Exame.

“Todos os dias recebemos dos nossos associados queixas de que é muito difícil contratar pessoas para as vagas existentes”, atendendo à baixa demografia, por um lado, e, por outro, à falta de qualificações em determinadas áreas. Esta pode, por isso ser uma oportunidade, para atrair imigrantes e colmatar deficiências, ainda que seja necessário ver o perfil de quem se vai receber. Quem já tiver formação em engenharia têxtil ou de equipamentos não terá, certamente, dificuldade em arranjar emprego no setor, ainda que as empresas prevejam sempre a necessidade de alguma formação.

O presidente da ATP recorda ainda experiências anteriores com cidadãos ucranianos que correram bem. “No fim do século XX já tivemos muitos ucranianos que vieram trabalhar para a construção da Expo e muitos deles acabaram, depois, por ingressar no setor têxtil”, tendo sido “bons trabalhadores”. Aconteceu, porém, que, “mais tarde, acabaram por regressar aos seus países”. É certo, por isso, que “haverá muita disponibilidade numa situação destas, pois o setor está a precisar de mão de obra”.

“É preciso agilizar processos de legalização”

“Temos carência em quase todos os setores. É uma questão de ver o perfil dos que vierem e ver quem tem mais apetências para o quê”, adiantou igualmente à VISÃO e Exame Luis Miguel Ribeiro, presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP). “Há muitas empresas que estão com falta de mão de obra e desesperadamente à procura”, garante. “Na construção civil e todos os setores associados é flagrante, mas também as áreas tecnológicas”, especifica, embora frisando que este é “um problema transversal, tanto para postos qualificados como indiferenciados”.

Mas chama desde logo a atenção para uma questão essencial: “Tem de haver procedimentos diferentes dos que tem havido em termos de legalização. Os processos têm sido muito burocratas, demorados e dolorosos. É preciso agilizar esses processos.”

Já na passada sexta-feira, 25, a AEP enviou uma carta ao ministro da Economia dando conta das necessidades de criar políticas que “evitem que os nossos jovens continuem a emigrar”, mas também que “aposte fortemente na inserção de imigrantes no nosso mercado de trabalho”. O “estabelecimento de acordos internacionais de captação de imigrantes de qualificações intermédias para os setores com maiores necessidades, em articulação com as associações empresariais” pode ser uma saída. Mas “o acolhimento de refugiados, além de razões humanitárias, pode também ajudar a suprir necessidades do mercado de trabalho e o défice crescente da população ativa”, defendeu.

AEMinho cria plataforma de emprego e apela ao corte de relações com a Rússia

Também a Associação Empresarial do Minho (AEMinho) deitou mãos à obra. Prepara-se para lançar uma plataforma de oferta de oportunidades de emprego, nos seus associados e não só.

“Os empresários poderão colocar de forma simples e rápida as suas ofertas de emprego a remetermos para as entidades diplomáticas ucranianas para a receção, emprego, fixação e integração de refugiados que queiram vir para o nosso país e para a nossa região trabalhar e fixar as suas famílias. Iremos desenvolver este programa em articulação total com as entidades diplomáticas ucranianas, com as empresas da região e com as entidades públicas locais de forma a garantirmos um processo célere, estruturado e eficiente”, anunciou em comunicado.

Mas, politicamente, foi ainda mais longe. Apela a “toda a comunidade empresarial que tenha relações comerciais com a Rússia, com as suas instituições ou com agentes económicos russos, que cesse de forma imediata essas relações de forma a exercer pressão sobre o governo de Moscovo para que pare imediatamente este ataque vil e infundado”. E justifica: “É imperativo isolarmos economicamente a sociedade empresarial russa para que isso seja um catalisador de desenvolvimento de ações que nos levem à paz”. E deixa claro que “esta não é uma ação contra os cidadãos russos ou a sua sociedade civil, mas sim contra a minoria que governa aquele país e que está a tentar destruir a ordem mundial que alcançamos”, lembrando que “a sociedade russa pode derrubar este poder desprovido de humanismo, de verdade e de valores”.

Calçado já está a contar as vagas

A indústria de calçado já se mostrou igualmente disponível para “acolher refugiados ucranianos” nas suas empresas. Em comunicado emitido ontem, 27, a APICCAPS fez saber que que abordou já o governo para dar conta dessa disponibilidade. “Há várias questões processuais a serem, desde já, consideradas: o estatuto de refugiado, o acolhimento no nosso país, a integração na segurança social ou mesmo no Serviço Nacional de Saúde. Importa, de igual forma, assegurar condições de trabalho no nosso país, na nossa indústria, e a imprescindível formação profissional”, lê-se no comunicado.

Diz ainda que, tendo sido já criado um grupo de trabalho Inter-ministerial, a APICCAPS “está já a efetuar um levantamento das oportunidades de emprego no setor”.

O mesmo aconteceu com a Associação Nacional das Indústrias de Duas Rodas, Ferragens, Mobiliário e Afins (Abimota).  “Avizinha-se uma nova crise migratória na Europa e o setor entende que deve ter uma participação ativa na sociedade, ser um elemento positivo no acolhimento desses refugiados, tanto mais que temos condições e empregabilidade”, diz, em comunicado, Gil Nadais, secretário-geral da Abimota.

Representando sobretudo a indústria de bicicletas, a Abimota diz cumprir, desta forma, “dois objetivos fundamentais”: a responsabilidade social e a contribuição para a competitividade do setor. “Mesmo com os salários mais altos que o setor das duas rodas e mobilidade suave pratica, não temos mão-de-obra, qualificada ou não, suficiente para responder às necessidades que a produção impõe. Por isso estamos a estudar, juntamente com os nossos associados, medidas para captar a fixação, com boas condições de trabalho, de populações que queiram encontrar em Portugal um porto seguro”, garante o secretário-geral da Abimota.

28/02/2022